Concessionárias de cargas e operadoras do setor metroferroviário investem em dispositivos tecnológicos para mitigar efeitos do clima e de intempéries nos trilhos das vias férreas
Operadoras de passageiros e concessionárias de cargas que atuam no setor ferroviário vêm investindo em tecnologias que mensuram o impacto do clima e de intempéries nos trilhos. Aparelhos de ultrassom e de radiografia são utilizados para verificar fissuras e defeitos, em geral, assegurando eficiência na manutenção e garantindo mais segurança a passageiros e cargas. O investimento em equipamentos dessa natureza é uma das estratégias adotadas para viabilizar a vistoria precisa de quilômetros de linhas em tempo hábil. Para se ter uma noção da interferência do clima no setor, neste ano, o frio intenso no Rio Grande do Sul fez com que um trilho do Trensurb trincasse entre as estações Fátima e Niterói, localizadas em
Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre.
Segundo Roberto Fisher, gerente de via permanente da Supervia, que opera o serviço de trens urbanos na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a ferrovia é bastante sujeita a intempéries, especialmente as relacionadas às temperaturas — tanto as elevadas quanto as mais baixas. “Quando a temperatura fica acima de 40°C, aqui no Rio, por exemplo, o trilho chega a 60°C, e isso causa uma dilatação, ocasionando um fenômeno conhecido como flambagem de linha, no qual os trilhos se dobram e, com isso, podem provocar descarrilamento. Com temperaturas muito baixas, por sua vez, os trilhos ficam mais frágeis, se retraem e acabam quebrando.”
Para auxiliar na manutenção e na mitigação desses efeitos,
as transportadoras ferroviárias, seja de cargas ou de passageiros, dispõem de carros-controle, que se locomovem sobre os trilhos e realizam medições automatizadas, por meio de sensores de laser e de posicionamento, de todos os parâmetros da linha, como nivelamento, alinhamento e variação de bitola. “Isso pode detectar um indício de flambagem por variação térmica ou fratura de trilho por defeito decorrente de temperaturas mais baixas. Esses equipamentos têm interface gráfica, todos os pontos detectados são georreferenciados por meio de coordenadas de GPS e repassados para o pessoal que faz a manutenção para executar as medidas corretivas”, explica Fischer.
A MRS Logística utiliza o Track Star, equipamento que providencia a medição correta e confiável das bitolas, do perfil do trilho e a geometria da via em tempo real. “Pode-se identificar algum possível defeito imperceptível ao olho humano, qual o parâmetro que pode estar sendo ultrapassado e a necessidade de futuras intervenções. Assim, atuamos preventivamente de forma eficiente. Durante a operação, há a presença de um coordenador de via que analisa os dados e pode, até mesmo, restringir ou interditar o trecho se algo estiver fora dos padrões”, informa a MRS, por meio da sua assessoria de imprensa.
Segundo a operadora, o equipamento é único na América do Sul. “Ele é fundamental para a manutenção dos níveis internacionais de segurança que a empresa alcança atualmente. Atua na prevenção de acidentes e, por consequência, eleva a segurança operacional que a companhia oferece aos seus colaboradores, clientes e à comunidade.”
Inspeção ultrassônica
Segundo Márcio Satoshi Torii, especialista em sistemas metroviários, os trilhos são, continuamente, submetidos a altas tensões mecânicas. As barras de trilho, explica ele, contêm tensões residuais provenientes do seu processo de laminação e suas respectivas soldas de união sofrem o mesmo fenômeno por conta do efeito térmico proveniente da soldagem. A esses processos, de acordo com o especialista, somam-se as tensões resultantes do manuseio, movimentação e instalação. Além disso, há as tensões de dilatação e de contração, geradas pela variação da temperatura ambiente nos locais em que os trilhos são instalados.
“No desempenho de suas funções, os trilhos passam por um gradual e crescente processo de degradação, que abrange desgaste, formação de irregularidades na superfície de contato roda-trilho, desenvolvimento e propagação de descontinuidades superficiais (microtrincas, escamações, lascamentos e destacamentos de material).”
Além disso, os trilhos e soldas podem conter descontinuidades internas (nas barras-trilho, por exemplo, há dupla laminação, presença de inclusão não metálica e segregação; e, nas soldas, faltam fusão, trincas de contração, rechupe, segregação, bolhas e porosidades).
“Portanto, é necessário controlar os níveis de tensões aos quais os trilhos são submetidos, e minimizar as irregularidades e descontinuidades que neles se desenvolvem”, diz Torii.
Nesse contexto, para a detecção e a caracterização desses problemas, outro dispositivo tecnológico que vem sendo utilizado no setor é o ultrassom, que mapeia as vias por meio de ondas com uma frequência superior àquelas que o ouvido humano pode captar.
Na rotina de manutenção da via permanente, o ultrassom é utilizado na inspeção dos trilhos, tendo por finalidade a prevenção contra a ocorrência de trincas e fraturas. No metrô da Bahia, administrado pela CCR, o equipamento de ultrassom leva o nome de Multi, e também é designado para identificar trincas e fissuras.
Juliana Romão, coordenadora de manutenção da empresa, salienta que, em função da utilização desse dispositivo, as operações do metrô baiano jamais foram interrompidas em decorrência de problemas na malha, desde a sua inauguração, em 2014.
De acordo com a MRS Logística, a implementação dessa tecnologia reduziu os problemas decorrentes de falhas nos trilhos dando maior segurança e, consequentemente, oferecendo maior disponibilidade da via. Assim como o carro-controle, o equipamento realiza o trabalho rapidamente, pois tem a capacidade de atingir velocidades de até 40 km/h.
Correção
Segundo os porta-vozes ouvidos pela reportagem, as composições também são equipadas com sensores de temperatura.
“A partir de parâmetros de limites máximos e mínimos, a gente consegue identificar, por exemplo, em dias mais quentes, elevações bruscas de temperatura. Isso aciona as nossas rondas e é feito o serviço de correção”, informa Roberto Fischer. De acordo com ele, quando detectada uma temperatura mais alta, a equipe de manutenção verifica se a dilatação está de acordo com o limite permitido nas juntas que ligam os trilhos.
“Nesse caso, os trilhos batem uns nos outros, podendo entortar e causar a flambagem. Para resolver isso, realizamos o processo de alívio de tensões. Tem que soldar toda a fixação do trilho, colocar rolete debaixo, utilizar martelo de bronze e executar um corte de até 30 centímetros nesse trilho que está sobrando. Isso acontece basicamente com temperaturas acima de 50°C.”
Com o objetivo de reduzir a gravidade de acidentes, os trens contam ainda com detectores de descarrilamento. “Se, por exemplo, quebrar um trilho ou um eixo, existe um dispositivo que vai comunicar o maquinista para que a composição pare imediatamente. Isso evita que o trem ande por uma extensão maior descarrilado, e que tenha um dano maior na via e na composição”, finaliza Fischer.
Clique aqui para ler a reportagem em PDF
Setembro/2017 – Revista CNT Transporte Atual