O governo federal pretende usar a renovação antecipada das concessões de ferrovias, que expiram na próxima década, para tirar finalmente da gaveta o Ferroanel de São Paulo. Um dos projetos logísticos mais importantes do país, o empreendimento bilionário é crucial para remover os trens de carga da malha operada pela Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos (CPTM), mas vem sendo adiado desde a década passada.
As negociações em andamento colocam a obra como uma contrapartida à prorrogação do contrato da MRS Logística, que vence em 2026, por 30 anos.
Essa é terceira tentativa, com modelos diferentes, de viabilizar o Ferroanel. Em 2008, a ideia era uma parceria entre os governos federal e estadual para viabilizar financeiramente o projeto, com participação da MRS – empresa que detém a malha onde começaria e terminaria o contorno ferroviário. O plano nunca foi levado para frente. Depois, a presidente Dilma Rousseff incluiu o empreendimento no Programa de Investimentos em Logística (PIL), lançado em 2012. O modelo de compra do direito de uso dos trilhos pela estatal Valec, no entanto, foi rejeitado pelos investidores e não permitiu avanços.
Agora, a intenção é incluir o Ferroanel como uma das principais obras negociadas com as atuais concessionárias de ferrovias em troca da extensão de seus contratos. A abertura de tratativas para a renovação antecipada das concessões foi anunciada em junho, durante o lançamento da segunda etapa do PIL, mas sem nenhum detalhamento.
No dia 29 de outubro, foi criada comissão na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para tratar do assunto. Além da MRS, a América Latina Logística (ALL) e a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) já formalizaram pedidos de prorrogação contratual.
O tramo norte do Ferroanel, com 52 quilômetros de extensão, tem estimativas preliminares de investimentos acima de R$ 2 bilhões. Não há valores atualizados. Em uma de suas últimas versões, o projeto ligaria Campo Limpo Paulista (por onde chegam os trens oriundos da região de Campinas) e Engenheiro Manoel Feio (a caminho do porto de Santos). Hoje, as composições que carregam grãos e minério de ferro circulam em horários cada vez mais restritos, principalmente durante a madrugada, para evitar interferência na rede de trens de passageiros da CPTM.
Além do Ferroanel, dezenas de obras, como novos pátios e contornos de municípios, estão sendo negociados. O plano do governo é fazer um aditivo de 30 anos nas atuais concessões. Em troca, as empresas teriam que se comprometer com dois tipos de investimentos – diretos e indiretos. O primeiro conjunto de investimentos envolve obras pactuadas com a União. O segundo grupo de intervenções seria necessário para atender às futuras metas de qualidade na prestação dos serviços que o governo pretende incluir nos contratos.
A lista deve ter indicadores, por exemplo, de produtividade e de redução de acidentes. As concessionárias terão liberdade para definir o que fazer exatamente para cumprir essas metas, mas é certo que isso exigirá desembolsos pesados.
Conforme ressaltou um funcionário do governo envolvido nas discussões, pode ser que, em muitos casos, as concessionárias não precisem de 30 anos para amortizar todos esses novos investimentos. Nesse caso, uma das possibilidades é cobrar uma outorga onerosa para fechar o equilíbrio econômico-financeiro dos aditivos contratuais. Esse dinheiro, caso o modelo dos aditivos contratuais seja fechado nos próximos meses, poderia entrar no caixa do Tesouro Nacional ainda em 2016. Não existem estimativas de valores.
No entanto, o processo de renovação das concessões deve se arrastar por vários meses. Ainda é preciso, por exemplo, fixar as taxas internas de retorno (TIR) para os investimentos adicionais nas ferrovias. No caso das rodovias, segmento para o qual também está sendo adotada a fórmula de esticar os prazos contratuais em troca de novas obras, a ANTT definiu uma remuneração de até 9,9% para os investimentos.