Ações no transporte de massa visam reduzir emissão de gases nas grandes cidades do Brasil
Sustentabilidade é desafio para a mobilidade urbana Sustentabilidade é desafio para a mobilidade
Pensar a mobilidade urbana de maneira sustentável é um tema de interesse global. O futuro das metrópoles passa pela redução dos impactos ambientais causados pelos transportes de massa. No Brasil, algumas cidades encontraram soluções para diminuir as emissões de gases do efeito estufa, enquanto o país ainda esbarra em desafios para avançar nesse sentido.
A mobilidade sustentável foi um dos temas discutidos na 23ª sessão da Conferência da Partes (COP 23), realizada em novembro de 2017, na Alemanha, reunindo autoridades de mais de 200 países para debater metas ambientais coordenadas entre nações.
Uma das ações mais relevantes surgidas no evento foi a formação da Aliança para a Descarbonização do Transporte. França, Holanda, Costa Rica e Portugal, que capitaneou a iniciativa, são alguns países que participam do grupo, assim como empresas como Michelin, Alstom e Itaipu Binacional.
Alguns países desenvolvidos estão bastante avançados no sentido da descarbonização do transporte. Na Alemanha, o Bundestag (Conselho Federal, órgão que participa da formulação de leis) votou, no início deste ano, pela proibição de veículos movidos a combustão interna no país. A medida, que ainda não virou lei, prevê a adoção exclusiva de motores elétricos até 2030. Já o Reino Unido pretende tirar todos os carros a gasolina e diesel das ruas até 2050.
O Brasil, por sua vez, vive alguns desafios. Dados do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), referentes a 2016, indicam um aumento de 4% no consumo de gasolina em veículos leves, enquanto o etanol caiu 10% na comparação com o ano anterior. Ainda segundo o SEEG, o total de emissões de CO² pelos sistemas de transporte de cargas e de passageiros aumentou quase 40% nos últimos dez anos.
Além disso, no COP 23, o país foi duramente criticado devido à Medida Provisória 795, que dá incentivos fiscais a companhias petrolíferas. A MP, que concede várias isenções de impostos até 2040 a empresas que atuam na exploração e produção de petróleo, foi aprovada no Congresso em dezembro.
O especialista em controle de emissões veiculares Olimpio de Melo Alvares Jr. vê a falta de planejamento urbano no Brasil como um dos entraves para a melhoria nos índices de descarbonização. “Se você tem uma política caótica e equivocada para as cidades, você induz as pessoas a usarem o automóvel para percorrer grandes distâncias”, diz Melo, que é coordenador da Comissão de Meio Ambiente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP).
Para Melo, uma solução reside em colocar em prática com rapidez o Plano Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), que define os sistemas coletivos e não-motorizados, como metrô e trens metropolitanos, como prioritários para as cidades médias e grandes do Brasil. “É preciso transformar a papelada em ação, para termos mais investimentos em transportes públicos sem potencial poluidor”, afirma.
Outro problema, segundo o especialista, é a precariedade e a desatualização da frota nacional, sejam automóveis, ônibus, caminhões, motocicletas ou vans. Melo diz que o Brasil começou a regulamentar a melhoria tecnológica dos veículos 15 ou 20 anos depois de países como Estados Unidos e Japão, e agora precisa compensar o tempo perdido.
A saída para resolver isso e colocar o Brasil mais próximo da tecnologia de ponta, na sua opinião, seria dar incentivos para acelerar a adoção dos veículos elétricos e híbridos. No entanto, essa é uma realidade ainda distante: números da FGV indicam que, em 2016, menos de 6 mil desses modelos circulavam pelas ruas do país.
Tecnologia pela sustentabilidade
No Metrô de São Paulo, o maior do Brasil, as principais ações de sustentabilidade são no sentido de reduzir o consumo de energia, segundo o gerente de Planejamento, Integração e Viabilidade da empresa, Luiz Antonio Cortez.
Duas ações foram implementadas nos últimos anos para melhorar nesse quesito. Uma foi a compra de trens com tecnologia mais avançada, além da modernização da frota antiga, que teve seus sistemas de bordo e motores atualizados. A outra foi a adoção de um controle das composições baseado em rádio digital, que traz mais inteligência e segurança, permitindo acelerações e frenagens mais eficientes.
Essas duas mudanças, de acordo com Cortez, levaram a uma economia de energia de 75% do sistema de tração, que corresponde a 80% do consumo de todo o Metrô.
A ampliação da rede é outro fator que contribui para a sustentabilidade. Considerando as mais de 4 milhões de pessoas que transporta por dia, o Metrô traz à cidade de São Paulo, de acordo com Cortez, uma redução de quase 1 milhão de toneladas de poluentes por ano, um número 4,4 vezes maior que a emissão veicular na Região Metropolitana da capital em 2016, segundo dados da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo).
“Imagine que, se a rede fosse desligada, essas viagens teriam de migrar para outros modos, como ônibus ou automóveis”, diz o gerente.
Na comparação por passageiro, estima-se que, segundo dados de emissões da Linha 4-Amarela, informadas pela concessionária ViaQuatro, um usuário de Metrô emita cerca de 6 g de CO² equivalente (medida utilizada para comparar as emissões de gases do efeito estufa) por quilômetro percorrido, uma quantidade quase 10 vezes menor que a de uma pessoa transportada pelos serviços de ônibus de São Paulo.
A ampliação da linha 5-Lilás, com a inauguração prevista de sete estações até o fim do ano, e a abertura da Linha 17-Ouro, ligando o Aeroporto de Congonhas até o Morumbi, devem melhorar esses indicadores, colocando cerca de 1 milhão de usuários a mais por dia no sistema.
Cidades mais sustentáveis
O transporte sobre trilhos também contribui com uma mobilidade urbana mais sustentável no Rio de Janeiro. Dados de 2016 apontam que o VLT Carioca, com apenas seis meses de operação e uma linha aberta, “economizou” 62 t de CO² por meio da compra de energia oriunda de fontes renováveis no mercado livre. Transportando 60 mil pessoas por dia útil, o VLT representa cerca de 40 mil carros a menos nas ruas, e uma redução de 4,8 toneladas/km de CO² equivalente emitidas por dia.
Com a fama de ser uma “capital verde” desde os anos 90, Curitiba é outro exemplo de ações de mobilidade urbana sustentável no Brasil. A capital paranaense recebeu, em 2016, menção honrosa no prêmio Sustainable Transport Award (STA), do Institute for Transportation and Development Policy (ITDP), por suas iniciativas de compartilhamento de bicicletas, pela atenção dada a passageiros com deficiência e pelos semáforos inteligentes, que ampliam o tempo de travessia para pedestres com mobilidade reduzida.
Já Salvador, cidade que é historicamente dependente do transporte motorizado e que já apareceu em rankings de piores trânsito do mundo, teve na inauguração do metrô, em 2016, um marco no caminho de uma mobilidade urbana mais sustentável. Além de tirar pessoas dos carros e ônibus, o Metrô Bahia, que transporta quase 300 mil passageiros por dia, tem um grupo formado para discutir ações de redução de impacto ambiental, como o uso de energia limpa nas estações, por exemplo.
Ter a sustentabilidade como parte do planejamento estratégico é uma realidade para as empresas que operam os sistemas de transporte no Brasil e no mundo. Esse é o caso da CCR, que opera o Metrô Bahia, o VLT Carioca e a Linha 4-Amarela do Metrô de São Paulo. O Instituto CCR, que coordena as ações socioambientais do grupo, é signatário dos princípios do Pacto Global, iniciativa internacional de adoção de valores fundamentais nas práticas de negócios, e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), elaborados pelas Nações Unidas.
Além de diminuir emissões, o Instituto CCR implementou ações, nas diversas empresas do grupo, para racionalizar o consumo de água, gerenciar resíduos sólidos, diminuir impactos em flora e fauna e adaptar seus negócios às mudanças climáticas.
“A sustentabilidade é um tema diferencial na proteção e na criação de valor do nosso negócio, de modo que proporcione benefícios para a sociedade, o poder público e os investidores”, diz Marina Mattaraia, gestora do instituto.