“Só investimento público não funciona. Só privado não existe”, diz presidente do BNDES

O presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Gustavo Montezano, afirmou que setores público e privado terão que trabalhar juntos para ampliar os investimentos em infraestrutura no Brasil já que não será possível que sozinhos possam cumprir com as necessidades para o desenvolvimento do país.

“A única forma de fazer isso é público com privado. Só público, como foi no passado, não funciona. E só privado não existe”, concluiu Montezano

A afirmação foi feita no seminário promovido pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), realizado junto com o TCU (Tribunal de Contas da União), nesta quinta-feira (28), para discutir o tema “Investimentos, infraestrutura e crescimento econômico” (com transmissão disponível neste link), onde os representantes do governo foram cobrados a apresentar soluções para os baixos níveis de investimentos públicos em infraestrutura na última década.

O presidente da Fiesp, Josué Gomes, abriu o evento apresentando números preocupantes. O país precisa investir 4% do PIB ao ano em infraestrutura pelos próximos 10 anos, o equivalente a R$ 320 bilhões a R$ 340 bilhões ao ano. Hoje, os investimentos são da ordem dos R$ 120 bilhões a R$ 140 bilhões. Desse montante, o Estado participa com R$ 30 bilhões a R$ 40 bilhões, de acordo com ele.

Ao lado do ministro e vice-presidente do TCU, Bruno Dantas, e do presidente do BNDES, ele cobrou a participação do Estado na alocação de recursos, considerada fundamental para o país alcançar os níveis de investimentos necessários para o setor: “Duas instituições são fundamentais para isso: o TCU e o BNDES”, alertou.

Na opinião do vice-presidente do TCU, Bruno Dantas, a ampliação dos investimentos públicos passa por uma reformulação do arcabouço fiscal brasileiro. “Os últimos anos foram especialmente alarmantes” em relação aos investimentos diretos, disse Dantas, atribuindo os resultados à crise fiscal e “à forma como lidamos com o teto de gastos”.

O ministro também lembrou que, no contexto da participação do setor privado, o TCU teve seu papel reforçado em diversas leis enviadas ao Congresso pelo Ministério da Infraestrutura, nas quais a corte de contas é reconhecida como autoridade responsável por dar o “selo de qualidade” aos projetos, o que garante segurança jurídica na percepção dos investidores.

‘Desconheço no mundo’

Na visão do BNDES, representada pelo seu dirigente, o Brasil passa por uma mudança, nos investimentos em infraestrutura, de um modelo “essencialmente dependente do recurso público” para um modelo de parceria público-privada. Montezano reconhece que a dependência unicamente de investimentos privados é insustentável.

“Não existe modelo de infraestrutura que vai depender só do privado. Eu desconheço, no mundo, qualquer país que funcione dessa forma”, disse o presidente, sinalizando, no entanto, que voltar ao tempo dos grandes desembolsos feitos pelo banco de fomento também não está nos planos.

Esse tipo de direcionamento dos bancos públicos é considerado pelo presidente do BNDES como “detrator” ao crescimento do mercado e ao compartilhamento do risco. Para Montezano, setores público e privado têm que trabalhar juntos, e o papel do Estado é o de compartilhar risco – por meio de “ativos regulatórios, orçamento público direto e balanços de bancos públicos”.

Depauperização do patrimônio público
O incremento dos investimentos públicos em infraestrutura é um pleito recorrente da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base), que participou do debate por meio de seu presidente-executivo, Venilton Tadini. Uma das sugestões da associação para endereçar a questão é a securitização de recebíveis renegociados com entes públicos, que poderia render de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões em recursos.

“Eu não entendo […] que o Tesouro não esteja na porta do Congresso Nacional, dado que já foi aprovado no Senado, para aprovar na Câmara dos Deputados. Isso libera recursos para o governo federal, não é aumento de dívida, não é antecipação de receita tributária, e infelizmente nós não vemos isso de forma clara e prioritária na agenda do governo”, disse Tadini.

O presidente-executivo da Abdib lamentou ainda a “depauperização” do patrimônio público nos segmentos de transportes e logística, em que, segundo ele, não se consegue manter nem mesmo o que está nas mãos do Estado.

Vantagens das concessões e PPPs
Para Martha Seillier, secretária especial do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), não é possível equacionar a necessidade de investimentos públicos apenas com orçamento público. A capacidade de contratação de obras pelo poder público com qualidade e foco na prestação de serviço não se mostrou adequada, disse Seillier, que defende as vantagens das concessões e PPPs (parcerias público-privadas) nesse sentido, em que “a obra é um meio para prestar um serviço”.

A secretária disse concordar com a importância dos investimentos públicos, mas questionou o desalinhamento dos incentivos nas contratações públicas, onde se encontram “tantas obras inacabadas”. A resposta, segundo ela, é o fato de as obras públicas serem remuneradas pelo percentual de entrega, e não pela prestação do serviço.

Seillier tratou também da necessidade de se avançar na legislação ambiental para que os investidores privados tenham maior clareza e previsibilidade. Um dos pontos que devem ficar mais claros é a definição de quem é o órgão licenciador, atribuição atualmente exercida por diferente órgãos.

29/04/2022 – Agência iNFRA