por Roberta Marchesi*
Independente de questões político/partidárias, desde o dia 1º de janeiro o Brasil tem um novo governo e todos os brasileiros estão juntos na busca pelo desenvolvimento do País. Uma das áreas mais sensíveis aos milhões de brasileiros é a mobilidade. Ela impacta de forma direta sobre a qualidade de vida da população e é imprescindível para que os cidadãos, no seu dia-a-dia, possam acessar todos os seus direitos sociais, tais como: educação, saúde, segurança e justiça.
Sendo a mobilidade urbana uma área tão sensível para o desenvolvimento das cidades e do País, o que os mais de 208 milhões de brasileiros podem esperar para esse setor no novo governo?
Em seu Programa de Governo o Presidente eleito, Jair Bolsonaro, reconhece a defasagem da malha ferroviária brasileira e defende a sua integração para estimular o transporte e impulsionar a infraestrutura. Conhecedor do déficit de investimento em transporte no Brasil e ladeado por uma equipe com formação voltada para a defesa dos setores estratégicos nacionais, espera-se que os projetos estruturantes, aqui também considerados aqueles da área de mobilidade sobre trilhos, tenham protagonismo em seu governo.
Baseado em um Programa onde a Economia toma um viés Liberal, no qual os processos de concessões e de privatizações prometem impulsionar o desenvolvimento da infraestrutura nacional, deve-se esperar que o novo governo também caminhe nessa linha para estimular o investimento na área de transporte de passageiros sobre trilhos. Seguindo uma tendência para esse setor, onde a iniciativa privada já tem respondido positivamente ao investimento nos últimos anos, deve-se esperar imprimir um ritmo ainda maior aos processos de concessão, que, se efetivados, contribuirão sobremaneira para a qualificação do transporte público no País.
Entretanto, para que os processos de Concessão/Parcerias Público-Privadas (PPP) possam vir a acontecer, é necessário que o Governo federal, os Estados e os Municípios possam garantir a sua parcela de investimento nos projetos. E esse será um grande desafio ao novo governo, especialmente nesse momento, onde os principais Estados brasileiros estão sem capacidade de endividamento e passam por sérias dificuldades para a obtenção de financiamentos para a execução de obras de infraestrutura. Dessa forma, a alternativa que se vislumbra é o fortalecimento do conceito das PPPs integrais, como a que foi feita para a retomada do sistema de metrô da Bahia, que é o maior case de sucesso brasileiro, tanto em termos de implantação de projeto de mobilidade sobre trilhos, quanto de desempenho na gestão pública.
Para garantir uma maior atratividade ao investidor privado, fazendo com que este esteja disposto a assumir o risco integral pelo desenvolvimento dos projetos de mobilidade sobre trilhos e alavancar a área de infraestrutura nacional, o novo governo terá um grande desafio pela frente, que é o de buscar a segurança jurídica dos contratos, condição determinante para a ampliação dos investimentos privados. Nesse sentido, estabelecer fortes Marcos Regulatórios, trabalhar pelo cumprimento dos dispositivos contratuais firmados, estabelecer garantias contratuais robustas e profissionalizar as Agências Reguladoras poderá contribuir para imprimir o ritmo de investimento que o Brasil precisa.
Um ponto importante que tem sido divulgado pela equipe do novo Presidente e o mercado acompanha com cautela é o de que os recursos antes geridos pelo Ministério das Cidades, responsável, dentre outros, pela área de mobilidade urbana, serão repassados diretamente para os Estados. Acreditamos que essa proposta de descentralização dos recursos Federais poderá contribuir para o fortalecimento dos Estados e de sua autonomia na implementação de projetos. Entretanto, também traz algumas preocupações, ligadas, essencialmente, ao planejamento de Longo Prazo e à garantia da execução de projetos estruturantes, que gerem benefícios efetivos para as cidades e seus cidadãos.
A falta de planejamento de longo prazo no Brasil é velha conhecida dos brasileiros e a sua ausência como instrumento orientador dos investimentos, especialmente aqueles estruturantes, tem levado as cidades a viver uma verdadeira crise em vários setores, o que não é diferente com a área de mobilidade. Congestionamentos intermináveis, elevado número de acidentes graves e com vítima, altos índices de poluição atmosférica e sonora degradam a qualidade de vida e submetem o cidadão a uma rotina diária de mais de 2 horas perdidas em trânsito todos os dias.
Investimentos em transporte estruturante sobre trilhos, que imprimirão velocidade, previsibilidade e qualidade ao transporte público das cidades e entre elas, aliado à sua integração física e tarifária com outros sistemas alimentadores, são a única saída para dar dignidade ao transporte de milhões de brasileiros. Entretanto, esses investimentos não devem ser puramente políticos, mas projetos de Estado, tratados em nível estratégico e com garantia de execução por parte da Federação. Nesse sentido, a incorporação do Ministério das Cidades e a indefinição sobre a sua atribuição preocupa os especialistas da área uma vez que os recursos serão repassados diretamente aos Estados, ficando refém de projetos políticos e não de Estado.
Muito embora ainda haja grande incerteza sobre os planos do novo governo para a área de mobilidade, notadamente sobre o transporte estruturante sobre trilhos, se vislumbra o fortalecimento do investimento privado em todo o setor de infraestrutura, o que poderá fazer com que aqueles Estados que já tenham projetos, com viabilidade e atratividade comprovadas, saiam na frente e possam, no curto espaço de tempo, dotar suas cidades de novas infraestruturas de mobilidade, gerando benefícios inestimáveis para a vida de seus cidadãos.
A ANPTrilhos acompanha as movimentações da transição do governo com relação às definições para a área de Mobilidade e se coloca à disposição para apresentar e detalhar as propostas para o avanço da mobilidade sobre trilhos. Esperamos que a equipe deste novo governo tenha um olhar inovador sobre a área de mobilidade do País, com coragem para enfrentar velhos problemas, resgatando mais de 60 anos de políticas públicas que priorizaram o transporte individual em detrimento ao transporte coletivo, deixando um importante legado de desenvolvimento da mobilidade, das redes de transporte sobre trilhos e das cidades para as futuras gerações.
* Roberta Marchesi é Diretora Executiva da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos), Mestre em Economia e Pós-Graduada nas áreas de Planejamento, Orçamento e Logística.