Em post na semana passada apontei para o fato de que a Lava Jato mexeu com um pilar central da questão do desenvolvimento do Brasil: corrupção política relacionada com obras de infraestrutura.
O impacto da Lava Jato já fica visível no leilão da semana passada de quatro importantes aeroportos, os quais foram vencidos por empresas européias em ambiente de concorrência e sem a presença das tradicionais empreiteiras brasileiras, que em sua maioria estão às voltas com a Lava Jato, e sem a presença de investidores de fundos de pensão estatais.
O exemplo desse leilão — competitivo, atraindo investidores interessados em negócios lucrativos, não em vantagens e esquemas controversos, negócios que se traduzam em projetos que atendam demandas reais e que fiquem de pé financeiramente do ponto de vista do mercado — deve se espalhar como modelo de inspiração para as necessidades de infraestrutura do Brasil.
Essa situação já existe em vários lugares do mundo há décadas. Especialmente quando a sociedade se faz ouvir de forma enfática, escarafuncha e acompanha, de forma civicamente mais proativa, os projetos de infraestrutura, sem ficar à mercê dos políticos e de empreiteiros. Foi por isso que o Plano Marshall foi bem-sucedido em reconstruir a Europa destruída pela Segunda Guerra em vez de enriquecer empreiteiros biliardários.
O primeiro passo neste processo cidadão de criar uma nova cultura de botar de pé infraesturura inteligente vem na forma do governo detectar consultivamente propostas de infraestrutura através de concursos públicos de ideias, através de parceria com organizações de natureza cívica, por exemplo, como o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e principalmente através de Solicitação de Propostas, de preferência com apelo em âmbito mundial, de projetos em regime de parceria público e privada.
Esse tipo de solicitação, conhecida internacionalmente pelas iniciais RFP (Request For Proposal) visa a dar visibilidade no mercado global oportunidades de interesse público no Brasil.
As RFPs devem estimular a apresentação de soluções apontadas conceitualmente como negócios que fiquem de pé, no qual entram nosso potencial de mercado, representado por 205 milhões de habitantes com demandas monumentais de saneamento, energia, logística, mobilidade urbana, etc. e que necessariamente geram estimulantes oportunidades legitimas de negócios para empresas de classe mundial e também para investidores e fundos de pensão internacionais, que necessitam investimentos com retorno seguro e em longo prazo.
Governos podem lançar RFPs por sua iniciativa própria ou a partir da sugestão de grupos de interesse cívico com associações empresariais, organizações ambientalistas, ONGs, comunidades, etc.
Na sequência do recebimento das propostas encaminhadas pelos consórcios empresariais interessados, os governos devem dar início a um processo de refinamento e alinhamento das propostas com o interesse público. Tudo isso de forma transparente, contando com audiências públicas, divulgação na mídia, sob o olhar atento do Ministério Público, etc.
De forma geral, o ideal é que cada proposta que amadureça nesse processo transforme-se em uma licitação internacional, o que vai garantir um nível superior de competitividade, muito distinto da cultura que vigorou até a Era Antes da Lava Jato, no qual prosperou a equação obra = corrupção.
O espírito do edital da licitação deve ser desenhado na forma de uma Parceria Público-Privada (PPP), na qual com transparência e senso de oportunidade o governo possa oferecer contrapartidas atraentes, não necessariamente na forma de crédito de agentes como o BNDES.
Essas contrapartidas podem ser altamente inovadoras, por exemplo, ativos públicos como territórios com potencial de revitalização, que possam ser monetizados no negócio, agregando valor econômico para o futuro concessionário e viabilizando soluções ganha-ganha tanto do ponto de vista público quanto privado.
Um bom exemplo que já está de pé e operando no Rio de Janeiro é o bonde moderno, chamado de Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e que já opera com um sistema ainda restrito ao centro do Rio, constituído de duas linhas totalizando 28 km.
O sistema VLT é um componente ideal de uma nova infraestrutura de mobilidade inteligente, eficiente e moderna. É só dar uma volta no mesmo para você se perguntar se essa opção não deveria ser imediatamente replicada na maior parte do Rio, tanto quanto em outras cidades do país.
Tudo depende de experimentarmos construir uma nova mentalidade de infraestrutura contemporânea da Era Pós Lava Jato.
É possível. Não é sonho. E está começando!
PS: Se você é do Rio e já andou de VLT e viu como o Centro do Rio foi revitalizado, sabe bem do que estou falando. Para você que é de fora sugiro visitar os documentos sobre o VLT enquanto Parceria Público Privada clicando aqui.