A entrada em vigor da regra do teto de gastos neste ano acentuou a preocupação com o estado da infraestrutura no país. Não bastassem os problemas evidentes de deterioração de serviços públicos já existentes, como estradas esburacadas e portos congestionados, os investimentos em novos projetos vêm diminuindo desde a segunda metade da década.
Levantamento da consultoria Inter.B englobando as áreas de transportes, saneamento básico, energia elétrica e telecomunicações estima que os investimentos foram equivalentes a apenas 1,37% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado, o menor percentual desde os anos 1970 e bem abaixo do patamar mínimo de 2,3% do PIB, necessário para compensar as depreciações. Desde 2014, o investimento em infraestrutura não atinge esse percentual.
A esperança agora é que o setor privado amplie os investimentos em transporte, energia, telecomunicações e saneamento básico. Essa participação já cresceu de 56,4% do total em 2010 para 69% em 2017, de acordo com a Associação Brasileira da Infraestrutura e das Indústrias de Base (Abdib). A associação defende que os investimentos deveriam ser excluídos do teto de gastos já que a participação do setor privado é sempre limitada, devido a fatores técnicos relacionados à natureza dos empreendimentos, riscos envolvidos e prazos longos de maturação. Para desfazer qualquer suspeita de viés ideológico, lança mão de dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para exemplificar que 70% dos investimentos em infraestrutura na região são feitos pelo setor público, enquanto o setor privado fica com os 30% restantes.
Mas, há quem pondere que a viabilidade da participação privada em infraestrutura depende de cada projeto; e que os principais problemas estão relacionados a questões institucionais como incerteza política, fragilidade regulatória, insegurança jurídica, burocracia e complexidade nos licenciamentos. Já Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, disse ao Valor (25/1) que há grupos privados interessados em infraestrutura, com capacidade de investimento e de captação de recursos nos mercados interno e externo.
Quando a inflação e os juros estavam elevados, a oferta de recursos era mais limitada dada a dificuldade de previsibilidade dos resultados dos investimentos. Naquele momento, praticamente a única alternativa era o BNDES. Mas o banco teve que reduzir seus desembolsos devido à crise fiscal. Depois de terem atingido o pico de R$ 187,8 bilhões em 2014, seus empréstimos despencaram para R$ 70,8 bilhões no ano passado. Além disso, o banco teve que mudar sua política de juros, caminhando para um alinhamento aos patamares praticados pelo mercado.
O Centro de Estudos do Mercado de Capitais-Fipe (Cemec-Fipe) notou uma mudança importante no perfil do financiamento corporativo, a partir do fim de 2016, quando o volume de emissões de dívida e ações ultrapassou os desembolsos do BNDES, pela primeira vez desde 2007. Se, em 2016, o total captado por meio de títulos de dívidas e ações pelas companhias ficou 6,4% acima dos recursos emprestados pelo banco estatal, de janeiro a novembro do ano passado, apenas as captações com papéis de renda fixa superaram em 93,4% o crédito concedido pela instituição de fomento. Dados fechados recentemente pela Anbima informam que as emissões de debêntures cresceram 49,8% no ano passado, atingindo R$ 90,8 bilhões, maior número da série histórica, iniciada em 2002, sendo que 10% foram destinados a financiar infraestrutura, volume igualmente recorde. No caso das ações, as emissões saltaram 273,6% para R$ 40,1 bilhões; no mercado internacional, as colocações de títulos aumentaram 60,4% e somaram US$ 32,5 bilhões.
O recente rali dos mercados, não interrompido nem mesmo pelo rebaixamento da nota de crédito do Brasil pela Standard & Poor’s (S&P) e pela tensão em torno do julgamento do recurso do ex-presidente Lula, é sinal de que a expansão do
mercado de capitais tende a continuar, mantendo abertas as torneiras do financiamento para investimentos e infraestrutura. No entanto, pontos de fragilidade como a situação fiscal e as dúvidas eleitorais podem ameaçar a recuperação.