Num momento em que a maioria dos indicadores econômicos dá sinais positivos, o desempenho do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não traz boas noticias. Os desembolsos deste ano são os menores dos últimos 14 anos, assim como as consultas – etapa inicial dos pedidos por recursos do banco e termômetro da busca das empresas por novos investimentos.
Segundo analistas, o elevado nível de ociosidade da economia e baixa demanda por financiamentos são os principais motivos para a queda dos desembolsos, sobre a já baixa base de comparação de 2016. Mas fatores adicionais também estão por trás do fraco desempenho, como o crédito mais caro das linhas de financiamento do banco e a maior atuação de empresas no mercado financeiro e de capitais.
Conforme dados divulgados ontem pelo BNDES, os desembolsos somaram R$ 55,18 bilhões de janeiro a outubro, baixa de 20% ante igual período no ano passado. Pela série com valores constantes, o resultado foi o pior desde 2003 (R$ 50 bilhões). Já as consultas de empréstimo atingiram R$ 81,55 bilhões de janeiro a outubro, 14% abaixo do mesmo período do ano passado. Foi também o desempenho mais baixo desde 2003 (R$ 80,6 bilhões).
A queda de desembolsos e das consultas foi notada na indústria e na infraestrutura, principalmente. Na indústria, houve recuo de 49% ante janeiro-outubro de 2016 nos desembolsos, para R$ 12,2 bilhões, enquanto as consultas recuaram 33%, para R$ 19,4 bilhões. Na infraestrutura, os desembolsos somaram R$ 19,7 bilhões, baixa de 2% no ano, enquanto as consultas caíram 21%, para R$ 29,9 bilhões.
Para Nelson Rocha Augusto, presidente do Banco Ribeirão Preto, o fraco desempenho reflete o excesso de ociosidade. Com maquinário parcialmente parado, número reduzido de turnos e demanda em lenta retomada, as empresas não encontram estímulos para investir na expansão de capacidade.
“Minha expectativa era e continua sendo de números de desempenho do BNDES para baixo. A razão é simples: não vamos ver recuperação do investimento este ano. O uso da capacidade instalada da indústria está em 76%, abaixo do padrão histórico de 85%. O que temos hoje é o que se pode chamar de investimento conceitual, que é uma reposição do capital. O investimento vai recuperar mais para frente, de forma lenta”, disse ele.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), concorda que a demanda exerceu peso sobre o desempenho ruim do BNDES. Para ele, porém, o arrocho sofrido pelo banco nos últimos anos explica parte dos resultados num momento em que o país deixou para trás a espiral recessiva. Ele cita taxa de juros e spreads mais altos, além de prazos menores de empréstimos.
“Quando a consulta cai menos do que o desembolso, como está acontecendo neste ano, é um sinal de que o arrocho vem do lado da oferta. Isso é reflexo de mudanças institucionais que vem desde a gestão da Maria Silva Bastos na presidência do banco. Quanto menos funding do banco, mais draconianas ficam as condições de empréstimo”, avaliou o economista.
Segundo Claudio Frischtak, sócio da Inter.B Consultoria, as empresas estariam encontrando novas formas de financiar
operações e investimentos. Estatísticas da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que as empresas captaram R$ 209,2 bilhões no mercado de capitais doméstico e externo de janeiro a outubro deste ano, avanço de 41% na comparação com o ano passado.
“Temos contatos com muitos investidores e posso afirmar que eles deixaram de olhar unicamente para o BNDES, embora em alguns casos as linhas do banco continuem atraentes, como em saneamento. Com a normalidade macroeconômica, juros mais baixos e sem a concorrência desleal do BNDES, o mercado de capitais vai se desenvolver muito”, avaliou o especialista.
Frischtak acrescenta que o fim do ciclo de grandes empreendimentos do setor elétrico contribui para o menor ritmo de desembolsos do BNDES, assim como as dificuldades enfrentadas pelas empresas envolvidas na Operação Lava-Jato, o que afetou planos de investimentos em áreas como rodovias.
Dos resultados do BNDES de janeiro a outubro, os desembolsos para a linha Finame, voltada para financiamento de máquinas e equipamentos, somaram R$ 15,966 bilhões, 11% acima de igual período de 2016. Foi um dos poucos números positivos do balanço de desempenho divulgado ontem. No acumulado de 12 meses até outubro, foram desembolsados R$ 19,2 bilhões na linha.
Para analistas, esse resultado melhor do Finame estaria associado ao desempenho do setor agrícola este ano e também a um processo de renovação de frota de algumas transportadoras, que tinham antecipado a substituição de caminhões no passado para aproveitar o PSI BNDES (Programa de Sustentação do Investimento). Essa linha foi extinta pelo banco em 2016.
Segundo o economista Claudio Considera, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), os investimentos devem fechar o ano em 15,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Pelas contas dele, o resultado desse indicador, chamado de taxa de investimento, seria o menor desde os anos 80, quando chegou a 14%.
Apesar disso, Considera avalia que os investimentos começam a voltar no país, de forma lenta. O consumo aparente de máquinas e equipamentos, por exemplo, cresceu 10,9% de dezembro de 2016 a setembro deste ano. “A construção permanece negativa, mas é menos negativa do que vimos anteriormente”, avalia o economista.