Por Roberta Marchesi
A redução dos níveis dos reservatórios de água se intensificou em 2021, fazendo com que o Brasil passe por sua pior crise hídrica em quase um século. O problema traz reflexos negativos para o País, não só porque afeta o abastecimento de água, mas porque impõe um duro aumento das tarifas, que pesam para a população e oneram toda a atividade econômica. E isso não seria diferente no setor de Transportes.
Com quase 100% do sistema eletrificado no Brasil, o setor de transporte de passageiros sobre trilhos é considerado um sistema eletrointensivo e depende da energia elétrica para a tração dos trens, metrôs, veículos leves sobre trilhos e monotrilhos.
Apesar de apresentar um consumo pouco expressivo quando considerado o panorama nacional (apenas 0,5% do total consumido no País), a energia é o segundo maior item de custo do setor metroferroviário e qualquer alteração nessa área impacta de forma direta sobre o custeio do serviço, gerando pressão sobre o valor da tarifa de transporte cobrada do passageiro.
A Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) mostra preocupação com a situação, uma vez que a crise hídrica pega um momento em que o transporte público também vive sua maior crise, em função da drástica redução de demanda gerada pela Covid-19. Passados 20 meses desde o início da pandemia, já são contabilizados mais de R$ 14 bilhões em déficit somente em receita tarifária, situação que piora a cada dia.
Desde 2015, o setor vem sendo impactado de forma dura por várias medidas na área de energia: os reajustes extraordinários promovidos pela ANEEL; o início do sistema de bandeiras tarifárias e a alteração da forma de cobrança integralizada das contas das operadoras. Considerando todas as altas, os operadores que estão no mercado cativo de energia contabilizaram um aumento real de 95% na conta e os operadores que atuam no mercado livre, através da atualização da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD), foram impactados com um aumento de 83%. É importante destacar que esse impacto não contabiliza os aumentos da tarifa de energia em si, mas apenas aqueles impostos ao setor como decorrência de novas políticas setoriais criadas para proteger o setor elétrico.
Sem qualquer política para resguardar o transporte público desses impactos, a ANPTrilhos teme que a crise hídrica imponha novos aumentos de tarifa elétrica e regulações que coloque o setor em uma posição difícil de ser revertida.
É fundamental que o Governo Federal seja sensível à crise pela qual as cidades estão passando e reflita essa urgência em requisitos que possam minimizar os eventuais impactos da crise hídrica sobre o transporte público, serviço essencial que atende a todo o cidadão brasileiro. Caso contrário, a situação, que já é extremamente crítica, ficará insustentável.
* Roberta Marchesi é Diretora-Executiva da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos); Mestre em Economia; Pós-Graduada nas áreas de Planejamento, Orçamento, Gestão e Logística e certificada internacionalmente em Gestão de Sistemas Ferroviários e Metroferroviários.
Artigo publicado na Revista CNT Transporte Atual, da Confederação Nacional do Transporte, edição de outubro de 2021.