Estações de trem sempre foram pontos de chegadas e partidas, despedidas e encontros, que renderam grandes cenas em filmes e obras literárias. E se tornaram, também, uma paixão para um contingente de dedicados construtores e colecionadores de miniaturas de locomotivas, vagões e plataformas de embarque, que utilizam as redes sociais para exibir suas reproduções de cenários reais, com peças que chegam a custar R$ 5 mil cada.
Os praticantes desse hobby, os ferromodelistas, seguem diversas linhas, que incluem aqueles que constroem dioramas (cenários tridimensionais) e os que preferem apenas pequenos cenários, com trilhos, vagões, estações e até pontes e florestas. Os detalhes, fielmente reproduzidos em menor escala, chamam atenção por representarem acontecimentos reais, cenas de filmes que apresentam o trem como importante elemento na história e até lembranças afetivas.
O maior centro de maquetes desse tipo é o Miniatur Wunderland, localizado na cidade alemã de Hamburgo. O local conta com mais de mil trens, que percorrem uma área de 1.150 m², com réplicas de cenários dos Estados Unidos, Suíça, Alemanha e Escandinávia.
O publicitário Gil Menin, de 57 anos, vem de uma família de ferroviários de Marília, no interior de São Paulo. A paixão por trens o acompanha desde criança, mas o ferromodelismo só surgiu em sua vida no Natal do ano passado, quando resolveu comprar uma caixa básica da Frateschi, a única empresa da América Latina que fabrica trens elétricos na escala 1:87 (miniatura 87 vezes menor que o original).
Entre as construções de Menin, está a reprodução de uma ponte que ele visitou no estado norte-americano de Connecticut. A ferrovia que passava pelo local foi desativada, mas voltou em uma versão em miniatura pelas mãos do publicitário, que construiu uma ponte apenas com hashis, os talheres japoneses. O publicitário batizou sua ferrovia em miniatura de Companhia Menin de Estradas de Ferromodelismo, em homenagem à Companhia Paulista de Estradas de Ferro, onde teve avô, pai, padrinho, tios e cunhado trabalhando em diversas épocas.
Gil Menin cataloga tudo o que gasta nos mínimos detalhes, já que o hobby pode pesar no bolso, apesar de o publicitário não se importar tanto com valores. Segundo ele, ‘não existe hobby caro, existe hobby que cabe no bolso’.
No inventário, o publicitário monitora quando comprou, quanto pagou, quem vendeu e qual é o equipamento. Uma única locomotiva chega a custar de R$ 4 mil a R$ 5 mil. Já as produzidas em outros países, como Inglaterra e os Estados Unidos, com materiais mais nobres, como latão, por exemplo, chegam a custar quase R$ 20 mil.
Além de publicitário, Menin também é professor e tem páginas sobre educação no Facebook, mas elas não chegam a alcançar metade do engajamento que ele consegue com postagens sobre ferromodelismo. “Participo de grupos de educação, tenho duas páginas e posto material lá. Fico esperando duas ou três curtidas em meses. Se posto qualquer coisa de ferromodelismo, em meia hora consigo 200 curtidas”, afirma.
Na Baixada Santista, a comunidade ferromodelista se reúne, basicamente, em grupos do Facebook. O Amigos Ferromodelistas da Baixada Santista, conhecido como Abebs, é responsável por grande parte das interações entre os praticantes do hobby na região. Ele conta com mais de 600 pessoas, que postam vídeos e fotos que ajudam os iniciantes nas construções, e também na compra e venda de artigos.
A maioria dos que colecionam trens é formada por homens de 50 a 70 anos, das mais variadas profissões. Mulheres representam uma pequena parcela entre os adeptos, mas Rejanne Silva, lojista no segmento de ferromodelismo há 10 anos, garante que nunca se sentiu prejudicada por ser minoria. “O ferromodelismo agrada crianças e adultos. A família toda participa”, diz.
Éder Silva Ramos, dono do espaço Caipira Voador World, em Santos, explica que nos grupos de Facebook é comum a venda de produtos quebrados para serem reformados, porque se tornam mais baratos. Em sua loja, eram realizados encontros e exposições.
O espaço reservado para ferromodelismo contava com oito maquetes, cada uma com um tempo de montagem de mais de 40 dias. Éder Ramos vendeu todas as maquetes depois de dois anos de exposição e, apesar de a loja não ter sido uma Miniatur Wunderland caiçara, em termos de grandiosidade, serviu como ponto de encontro para os adeptos da Baixada Santista.
Quanto às técnicas de construção, Ramos aponta que materiais diversos à disposição implicam custo menor. O espaço em casa também é importante. “A pessoa tem de ter espaço. Muitos não têm lugar para colocar uma maquete de 2,40m x 1,50m, por exemplo. Por isso, preferem uma escala menor para fazer um cenário bacana. As montanhas, florestas e decorações construímos com isopor, jornal, madeira. Muita coisa é feita com um custo bem baixo”.
No ferromodelismo, a venda e revenda de itens é uma prática comum. Não são poucos os praticantes que optam por vagões e locomotivas usados. Ao comprar alguma peça, a noção das escalas é essencial. Quanto menor a escala, mais caros os produtos.
A ‘Z’ é 220 vezes menor que a original, e a ‘N’, 160 vezes menor. Peças nessas escalas não são fabricadas no Brasil, devido ao alto custo. Em território nacional, a mais utilizada é a escala ‘HO’, que reproduz os trens em tamanho 87 vezes menor que o original. Na escala HO, uma locomotiva chega a custar em torno de R$ 400.
06/02/2021 – G1 Santos