Retomada do fluxo deverá vir só com a expansão das linhas, avaliam operadores
02/04/2024 – Valor Econômico
Quatro anos após o início da pandemia, o volume de passageiros de metrôs e trens urbanos segue 24% inferior ao patamar anterior à crise. Em 2023, o fluxo de usuários do sistema atingiu 2,48 bilhões de pessoas, uma alta de 6% em relação ao ano anterior, mas ainda aquém de 2019. Os dados são do balanço anual da ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos), obtidos em primeira mão pelo Valor.
A percepção no setor é que o home office é o principal entrave para a recuperação do modal, dado que 65% da demanda está ligada ao trabalho. “A retomada varia de acordo com a linha. Tem locais com crescimento maior, que já chegaram a 90% do período anterior à pandemia, e outras linhas com resultado mais baixo. Mas não temos uma projeção para a volta a 100% do que era antes, porque houve uma mudança estrutural”, afirma Joubert Flores, presidente da associação.
Nas operações da CCR, o crescimento de tráfego em 2023 foi de 12%, acima da média nacional. Porém, o nível ainda está em torno de 7% abaixo do pré-pandemia, segundo Marcio Hannas, que comanda a divisão de mobilidade do grupo. A empresa atua em São Paulo (linhas 4, 5, 8 e 9), no Rio de Janeiro (VLT Carioca e Barcas) e no Metrô da Bahia.
“Vemos uma recuperação constante. Em 2024, até fevereiro, a alta é de 8,9%. É óbvio que o teletrabalho é uma tendência que não vai acabar, mas também há um retorno ao presencial”, diz.
No Metrô de São Paulo – onde a movimentação está 20% abaixo do nível de 2019 -, a persistência dos efeitos da pandemia deverá impactar também o planejamento da expansão das linhas.
Para ter uma maior clareza sobre essas mudanças estruturais, a companhia paulista antecipou sua pesquisa de origem e destino, que é decenal e seria feita em 2027. O mapeamento começou no segundo semestre de 2023, e os resultados deverão sair em novembro deste ano, segundo o presidente da estatal, Júlio Castiglioni. “A ideia é entender o que mudou e onde mudou. Temos algumas hipóteses que merecem ser confirmadas. Por exemplo, a de que temos menos alunos se deslocando, e a de que a qualificação do trabalho formal está ligada ao teletrabalho. Temos de ver se de fato isso é verdade, para planejarmos a ampliação”, diz.
A expectativa hoje é que a recuperação do fluxo virá apenas com a ampliação do sistema e a atração de novos passageiros. No Metrô de São Paulo, Castiglioni não vislumbra o retorno aos níveis pré-pandemia antes de 2027, quando deverão ser entregues uma série de obras importantes, como a extensão da Linha 2 e a nova operação da Linha 17.
“Do ponto de vista de planejamento, o Metrô já não trabalha pensando em recuperação dessa receita. Nossa lição de casa tem sido qualificar o custeio. Não adianta acreditar que a demanda vai crescer constantemente, porque essa equação ruiu após a pandemia”, afirma o executivo.
Em paralelo, há o esforço para garantir a execução das obras. Em 2023, o valor executado em ampliações e melhorias na rede foi de R$ 2,67 bilhões. Neste ano, o orçamento é de R$ 4,7 bilhões, um volume recorde, diz ele.
Não há projeção para o retorno a 100%; a mudança é estrutural”
— Joubert Flores
Hannas também aponta os investimentos como um fator importante para a retomada, pelas ampliações e pela melhora do serviço. Na rede da CCR, ele cita a inauguração do tramo 3 em Salvador, no fim de 2023, e a recente abertura do terminal de integração do VLT Carioca, obras que deverão atrair novos usuários. O plano de investimentos da companhia para este ano, para a área de mobilidade urbana, é de R$ 2 bilhões. Do total, cerca de R$ 1,4 bilhão deverão ser destinados à concessão das linhas 8 e 9, na aquisição de trens e melhorias de infraestrutura da via.
Em uma perspectiva de mais longo prazo, Hannas também diz que há conversas com o Estado para ampliar as linhas 4 e 5, mas ainda não há definição sobre como as obras seriam feitas. “Estamos trabalhando nos projetos de engenharia, para levar as linhas a regiões não atendidas. Seriam investimentos pesados, em trechos novos. De forma preliminar, algo na ordem de R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões para cada linha.”
No entanto, a avaliação é que o ritmo de crescimento da rede a nível nacional caminha lentamente, segundo Flores. Em 2023, a extensão da malha do país chegou a 1.133,4 km, um avanço anual de apenas 4 km. “É um crescimento muito pequeno, quase inexistente”, afirma.
A expectativa para este ano é mais positiva. Estão em curso obras para 66 km de novas linhas. Destas, 20 km de linhas poderão ser entregues em 2024, segundo a associação. “Caso isso se concretize, já seria cinco vezes mais do que no ano passado.” As entregas programadas para este ano incluem obras no Ceará, Rio de Janeiro, São Paulo, Piauí e Paraíba.