Em Recife, a solução é o metrô, diz engenheiro

Recém-empossado na presidência da Associação Brasileira de Engenheiros Civis de Pernambuco (Abenc-PE) o engenheiro civil Stenio Cuentro defende a necessidade de expansão do metrô como única saída para os problemas de mobilidade na Região Metropolitana do Recife (RMR). E critica o investimento de dois bilhões de reais na construção de corredores de ônibus na capital pernambucana, que para ele se mostra ineficiente. Na entrevista, concedida ao jornal Folha de Pernambuco, ele fala de vários temas relacionados à gestão urbana, entre eles o problema do transporte. Cuentro já esteve à frente de vários organismos do setor público, entre eles a Diretoria de Engenharia de Tráfego do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PE)

A falta de mobilidade é um tema recorrente nas grandes cidades e, no Grande Recife, esbarra em projetos inacabados, como o BRT. Como superar isso e avançar?
Temos a faixa exclusiva de ônibus e as ciclovias que vêm sendo implantadas e são coisas muito boas, mas que estão restritas ao Recife. Nos outros municípios da Região Metropolitana, pouco foi feito em relação a isso. Ainda assim, esses serviços são soluções de curto prazo para você aliviar um pouco a imobilidade. Na realidade, a solução para a mobilidade, isso no mundo todo, é o transporte de massa, o metrô. Não tem nenhuma novidade nisso, em defender a extensão do metrô para a Região Metropolitana toda. O que a gente vê é que o sistema de transporte metropolitano foi planejado há 30 anos. Ele ainda nem foi todo implantado e já está superado há muito tempo. E o metrô não tem tido prioridade.

Mas essa expansão tem como entrave o custo, que é alto…
Gastou-se R$ 2 bilhões no BRT, que não foi totalmente implantado. Com R$ 2 bilhões seria possível construir entre cinco e dez quilômetros de metrô na Região Metropolitana. Principalmente na área mais complicada, onde o ônibus circula, a área mais central. E já há estudos nesse sentido. A gente tem que notar que o valor que hoje se investe em ônibus é uma solução que é desaprovada pela população. Com esse investimento, você já teria outra linha de metrô para a Zona Norte (do Recife), para a região de Olinda e Paulista. Metrô é uma coisa que todo dia você tem que fazer um pedaço. Isso acontece em Tóquio, Londres, Nova York. O ônibus é que tem que complementar o metrô, e não o contrário. A bicicleta complementa o ônibus, e o pedestre, a bicicleta. Só que aqui a hierarquia está invertida.

Sobre habitação, que contribuição pode ser dada para a elaboração de um plano estadual?
Tem que haver uma mudança nessa lógica de hoje. A habitação não pode ser tratada como uma doença, que a cada dez anos aparece um governo que quer fazer 50 mil casas, 100 mil casas. A habitação é um problema que o Estado tem que intervir todo dia e o dia todo. E plano habitacional é isso. Não só são grandes conjuntos habitacionais. Você tem os vazios urbanos em toda a Região Metropolitana. Há terrenos de 20 metros por 20 metros, onde se pode colocar dezesseis habitações. Você não tem que fazer cinco mil habitações e esperar oito anos para construir um empreendimento. A população do Estado de Pernambuco cresce organicamente à razão de 70, 80 mil pessoas por ano. E como resolver esse problema? Onde é que esse pessoal vai morar? Ou seja, tem que ter um programa de habitação. Na nossa concepção, toda semana tinha que estar sendo entregue 50 casas ou 50 apartamentos na Região Metropolitana. Isso tem que fazer parte da rotina da Região Metropolitana, da rotina do Estado, e não como um grande evento midiático.

Outra proposta é discutir a reutilização da água. De que forma isso poderia vir à prática?
Há um grande shopping center na cidade do Recife que, sozinho, por mês, consome 30 milhões de litros de água. Só para ter uma ideia, dá para abastecer uma cidade, talvez, de 50 mil habitantes. Aí você pergunta: esse empreendimento reusa água? O grande consumo, às vezes, é no sistema de ar condicionado. Depois disso, a água é jogada fora. Essa água poderia ser usada nos banheiros, na limpeza, nas bacias de descarga, nos mictórios… Em Israel, por exemplo, você reusa a mesma água 11 vezes. Então, para começar, nos projetos de médio e grande porte, aqui, você primaria pelo reuso da água para poder licenciar. É o que pretendemos discutir. Obrigar o reuso da água é uma solução ambientalmente correta e economicamente mais barata. Recentemente tivemos cortes no abastecimento por falta de água na Região Metropolitana. E, mesmo assim, você hoje toma banho e aquela água do banho é jogada diretamente na rede de esgoto. Isso tem que mudar. A gente quer estimular essa prática. Tem que virar consciência e obrigação.

E o desafio de plantar um milhão de árvores em três anos em Pernambuco?
Essa é uma contribuição não do engenheiro, mas do cidadão que se formou engenheiro. Não que a gente vá sair carregando um milhão de árvores nas costas, mas a gente se articula com os órgãos e as entidades e promove essa ação de uma forma coordenada. A gente quer transformar a Semana do Meio Ambiente no Ano do Meio Ambiente. Vamos distribuir mudas de árvores para as pessoas fazerem sua parte. Vamos orientar para que plantem, fotografem a árvore e mandem para a gente pelo whatsapp onde está plantada e como estão cuidando dela. O meio ambiente é responsabilidade de todo mundo.

Como os engenheiros civis podem contribuir para a superação dos desafios de Pernambuco?
É preciso discutir. Se há outras experiências em outros estados, vamos ver. Se há experiências no exterior, vamos ver. Porque o problema de mobilidade é problema aqui. Lá fora, já foi resolvido. Habitação é problema aqui. Lá fora, já foi resolvido. Tem que buscar o que funcionou, senão você se tranca. É isso que estamos nos propondo a fazer. Estamos nos propondo a ser um fórum de discussão dessas políticas. Isso faz parte da nossa profissão. O engenheiro planeja, executa, tem uma boa formação. Essa é nossa proposta: discutir esses temas de uma forma bem abrangente.

03/02/2016 – Folha de Pernambuco