Atendimento no metrô ressuscita maioria das vítimas de parada cardíaca

Severino de Souza Neto, Renielson Santa Rosa, Airton Inamine, Aderito Sanches e Maria Luiza da Silva; os cinco sobreviveram após serem atendidos por paradas cardíacas dentro de estações do metrô. fOTO: Diego Padgurschi/Folhapress
Severino de Souza Neto, Renielson Santa Rosa, Airton Inamine, Aderito Sanches e Maria Luiza da Silva; os cinco sobreviveram após serem atendidos por paradas cardíacas dentro de estações do metrô. Foto: Diego Padgurschi/Folhapress

O aposentado Aderito “apagou” na estação Clínicas. A auxiliar de enfermagem Maria Luiza, na Vergueiro. O atendente Airton caiu um pouco mais à frente, na estação Liberdade. O vendedor Severino e o desempregado Renielson, 450 metros adiante, na praça da Sé.

Os cinco sofreram paradas cardíacas nos trens ou nas plataformas do metrô de São Paulo. Foram salvos graças a massagens e choques com desfibrilador.

Nesses ataques, as pessoas caem no chão inconscientes e têm fibrilação ventricular, condição em que o coração bate acelerada e desordenadamente e os batimentos só podem ser controlados por choques elétricos.

A cada um minuto sem socorro correto, a sobrevida é reduzida em 10%. Se nada for feito, em dez minutos a pessoa pode estar morta.

Hoje, todas as 68 estações do metrô têm desfibriladores, e funcionários recebem treinamento do InCor (Instituto do Coração). O investimento mensal é de R$ 65,6 mil.

O uso do equipamento é obrigatório desde 2006 em locais da cidade para mais de 1.500 pessoas, assim como o treinamento de funcionários para primeiros socorros –não se sabe quantos de fato cumprem a legislação municipal.

Nas estações do metrô, nos últimos nove anos, foram atendidas 104 pessoas com paradas cardíacas. Dessas, 55 “ressuscitaram” após as manobras e saíram vivas rumo a hospitais da região.

Agora, pela primeira vez, um estudo recém-publicado no periódico “Journal of the American Heart Association” investigou 62 desses casos do metrô, ocorridos entre 2006 e 2012, do começo ao fim.

Das 45 pessoas que saíram vivas das plataformas, 11 morreram a caminho do hospital e outras 11, durante internação hospitalar. Vinte e três (37%) sobreviveram sem ou com sequelas mínimas.

Para o cardiologista Sergio Timerman, que dirige o laboratório de treinamento de emergências cardiovasculares do InCor e é um dos autores do estudo, o índice é muito bom levando-se em conta que, sem primeiros socorros feitos de forma correta, a taxa de sobrevida seria muito menor, de menos de 2%, segundo a literatura médica.

Mas, se comparado a programas internacionais, como o dos cassinos em Las Vegas (EUA), em que o índice de sobrevivência é o dobro (74%), é possível avançar mais, principalmente nos outros elos da corrente (transporte e atendimento hospitalar).

“Os hospitais são muito heterogêneos, precisam estar mais bem preparados para receber e tratar a vítima de ataque cardíaco”, diz Timerman.

SOBREVIVENTES

O médico Maurício Alves, chefe do departamento de engenharia e saúde do Metrô, explica que, em geral, são os seguranças treinados que prestam os primeiros socorros às vítimas assim que acionados. Do aviso até o início das manobras, não leva mais de dois minutos, segundo ele.

“Eles não foram seguranças, eles foram os meus anjos da guarda”, diz Severino José de Souza Neto, 62, que “ressuscitou” após sete choques em dezembro de 2013.

Além de duas pontes de safena e uma mamária, hoje ele carrega no peito um desfibrilador implantável –aparelhinho que dispara choques caso o coração pare de novo.
Renielson Alves Santa Rosa, 38, já é veterano em tomar choques. Após sofrer uma parada cardíaca no metrô em 2008 e ser reanimado com oito deles, hoje ele também tem
minidesfibrilador no peito.

Daquele ano até 2013, ele contou 50 choques internos. “Pareciam socos de dentro para fora. Mas não reclamo. Foram eles que me mantiveram vivo”, diz.

Aderito dos Santos Sanches, 67, teve a parada cardíaca na fila para comprar o bilhete na estação Clínicas. “Caí duro. Estava com R$ 10 na mão. Segurei firme. Dizem que eu não larguei o dinheiro nem na hora do choque.” Passou um mês internado e saiu do hospital com três pontes de safena e uma mamária.

A auxiliar de enfermagem Maria Luiza da Silva, 56, sofreu o ataque cardíaco há dois meses. Tinha chegado nervosa na estação Vergueiro após registrar um boletim de ocorrência por racismo. “A filha de um paciente tinha me ofendido muito, me chamado de negra ordinária, e o meu coração não aguentou.”

Airton Seiziro Inamine, 59, que sofreu a parada cardíaca na plataforma do metrô Liberdade, comemora o fato de ter “tombado” no lugar certo. “Se eu tivesse caído na rua, iam achar que era um bêbado. Não teria tido um socorro tão rápido e certeiro.”

28/10/2015 – Folha de S. Paulo Online