O grupo CCR, que acaba de conquistar a concessão de 15 aeroportos, não pretende parar por aí. A companhia se prepara para os próximos dois leilões de infraestrutura, ainda em abril: das linhas 8 e 9 da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e da rodovia BR-153. Além deles, já estão no alvo a BR-163, a Dutra e os blocos de rodovias no Paraná. A mensagem é enfática: não faltará poder de fogo nos próximos projetos, afirmou o presidente, Marco Cauduro, em conversa com o Valor.

“A empresa está preparada sob todos os aspectos. Os investimentos não acontecem todos de uma vez, são contratos de longo prazo, com diferentes ciclos de investimento: alguns são mais concentrados nos primeiros dez anos, outros são mais espaçados. E, junto com os investimentos, vem a geração de caixa. Temos estrutura de capital para aportar mais”, disse o executivo, em sua primeira entrevista desde que assumiu o cargo, em julho de 2020.

Na última semana, ao vencer o leilão de dois blocos de aeroportos, a CCR se comprometeu a fazer investimentos de R$ 4,7 bilhões ao longo dos próximos 30 anos. Além disso, terá que desembolsar R$ 2,9 bilhões em outorgas, já nos próximos dias.

Cauduro considera confortável o nível de endividamento do grupo, que encerrou 2020 com uma alavancagem de 2,9 vezes na relação entre dívida líquida e Ebtida (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). O índice, usado como referência para medir a capacidade de contrair novos empréstimos, está dentro dos limites da empresa, que procura manter o indicar abaixo de 3,5 vezes. “Mas nada nos impede de ultrapassar momentaneamente essa marca, caso necessário”, diz ele.

O desafio de investimentos dos próximos leilões não é trivial. Na concessão da CPTM, estão previstos R$ 3 bilhões. Na BR-153, o valor é de R$ 7,8 bilhões. No caso da Dutra, que é uma prioridade para a CCR – que já opera a rodovia desde o fim dos anos 1990 -, o montante chega a R$ 14,5 bilhões, fora as outorgas ofertadas.

Além disso, a companhia enfrenta um momento difícil em suas concessões, duramente afetadas pela pandemia. No entanto, nada disso impedirá a CCR de ser competitiva, ressalta, repetidamente, o presidente: “Mesmo com uma retomada mais tardia, em 2022, estamos preparados”.

O otimismo da empresa é compatível com o atual ciclo de leilões de infraestrutura no país. Para Cauduro, há uma conjuntura de fatores positivos: um portfólio extenso de projetos, editais bem estruturados, agências reguladoras mais maduras e acesso amplo a financiamento.

Além disso, nos próximos anos, o grupo verá o fim de contratos importantes. Até o fim de 2022, deverão se encerrar as concessões rodoviárias da NovaDutra, da RodoNorte e da ViaOeste – a não ser que haja prorrogações. Juntos, os três ativos representam cerca de 30% da receita bruta do grupo. Para Cauduro, porém, não há pressão para renovar a carteira: “Não vamos crescer a qualquer custo. A reciclagem do portfólio é um processo natural”.

A prioridade da CCR serão as três áreas nas quais já atua: rodovias (que representa 77% da receita), mobilidade urbana e aeroportos. “São setores em que temos uma compreensão profunda da matriz de risco e uma relação estabelecida com a cadeia de fornecedores”, afirma.

O segmento de aeroportos é o mais recente no portfólio do grupo, que, até semana passada, tinha uma presença tímida, com três ativos internacionais (no Equador, na Costa Rica e em Curaçao) e apenas um no Brasil (Confins, em Belo Horizonte, operado pela BH Airport). Agora, a empresa passará a gerir mais 15 unidades, nas regiões Sul, Central e no Nordeste do país.

“Nos tornamos um dos principais operadores do país e teremos um papel de protagonismo nas novas oportunidades. Trata-se de um negócio em que escala é fundamental. É importante ter capacidade de coordenação de oferta, construção de malha, vantagem na negociação com clientes, fornecedores. A sinergia entre os aeroportos é grande”, diz.

Ele afirma que há interesse no próximo leilão, em que serão licitados as “joias da coroa” do setor: Congonhas (dentro de um bloco regional São Paulo-Mato Grosso do Sul); e Santos Dumont (no lote Rio de Janeiro-Minas Gerais).

Um dos planos do grupo com os novos ativos é formar “hubs logísticos” com integração de modais. No Sul, por exemplo, o fato de a CCR já operar estradas na região elevou o interesse pelo bloco de aeroportos, diz o presidente.

Com tantas oportunidades nos três setores, a entrada em novos segmentos ficou em segundo plano, segundo Cauduro. Ainda assim, o grupo segue estudando novos negócios, como água e esgoto. A CCR chegou a avaliar a fundo o leilão da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal), em setembro de 2020. O movimento, porém, foi mais um esforço de conhecer melhor o mercado do que uma decisão estratégica. “Reconhecemos que há uma evolução no setor, mas temos um entendimento da matriz de risco e uma capacidade de precificação muito menor”, afirma.

A chegada de Cauduro no comando da CCR marcou o fim do processo de reestruturação interna da empresa, iniciado em 2018, ano em que veio à tona o envolvimento do grupo em escândalos de corrupção e caixa 2, em São Paulo e no Paraná.

Desde então, deixaram a companhia mais de 70 executivos, toda a liderança foi substituída e foram firmados acordos de leniência com as autoridades, prevendo pagamentos totais de R$ 831,5 milhões – além dos R$ 71,5 milhões pagos aos executivos que se tornaram delatores. Os principais acionistas do grupo são a Andrade Gutierrez, a Camargo Corrêa e a Soares Penido (cada um com uma fatia de aproximadamente 15%), mas a maior parte das ações (55%) são negociadas na B3.

16/04/2021 – Valor Econômico