A natureza agradece

Implantação de sistemas de reúso de água elas operadoras de trens metropolitanos e metrôs garante economia e sustentabilidade

Nos últimos anos, os grandes centros urbanos brasileiros têm enfrentado problemas com racionamento de água. A crise hídrica tem modificado o jeito de o brasileiro lidar com o uso desse recurso tão essencial. Para reduzir o consumo e, assim, diminuir os impactos ambientais e os gastos, empresas de transporte têm adotado alternativas. No setor de transporte metroferroviário de passageiros, o reúso de água já é uma realidade. Segundo a ANPTrilhos (Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos), das 14 empresas que operam o serviço em todo o Brasil, seis já implantaram sistemas que permitem a reutilização da água para a lavagem de trens e metrôs. “A questão do reuso é vital para todos, e o segmento metroferroviário não atua de forma diferente. Temos, praticamente, 4.500 carros de passageiros e 557 estações em operação, distribuídos em 11 Estados, em todo o Brasil”, destaca o diretor-executivo da ANPTrilhos, João Gouveia.

Ainda não é possível mensurar a economia nacional que a reutilização de água na lavagem de trens e metrôs tem proporcionado, mas as experiências das concessionárias apresentam resultados bastante positivos.

Na SuperVia, que opera os serviços de trens no Rio de Janeiro e em mais 11 municípios da Região Metropolitana, o sistema entrou em operação em 2012. De acordo com a técnica de meio ambiente da concessionária, Geisa Fernanda, o consumo médio para a lavagem de um trem com quatro vagões é de, aproximadamente, 4.000 litros de água. Os trens da SuperVia fazem mais de mil viagens por dia e variam de quatro a oito vagões. Por mês, são lavados em média, 180 trens, o que representa um gasto aproximado de 830 mil litros de água.

“Com o reúso, podemos utilizar a mesma água em várias lavagens. Estimamos que, anualmente, a economia seja de R$ 30 mil. Desde o início do projeto, já economizamos R$ 210 mil”.

Segundo Geisa, a Etei (Estação de Tratamento de Efluente Industrial) processa os resíduos sólidos que são retidos com a lavagem e depois transferidos para uma caixa de areia. A água limpa é, então, direcionada para um reservatório, de onde retorna para ser utilizada em uma nova lavagem.

No Metrô Bahia, a reutilização de água chega a 70%. Com uma frota atual de 40 trens, a empresa que opera o sistema metroviário de Salvador e Lauro de Freitas deu início às lavagens com o reúso de água em outubro de 2016 e já contabiliza uma economia de 656 mil litros por mês (R$ 13 mil). O gestor de manutenção do Metrô Bahia, José Cako, explica que, com a ampliação do número de estações e trens em operação, os resultados devem ser ainda mais satisfatórios. “Após a implantação da Estação Aeroporto, a economia prevista será de 795 mil litros de água por mês, o que representa R$ 15 mil”.

Cako ainda ressalta que, até o final da concessão, em 2043, algo em torno de R$ 5 milhões serão economizados somente com o reúso de água.

“Com isso, será possível instalarmos novas passarelas ou colocarmos cinco novos veículos de inspeção de vias em operação. Estamos colaborando com o meio ambiente e gerando economia, que é crucial para o negócio.”

Tratamento

De acordo com a bióloga e pesquisadora do Grupo Água e Ambiente Construído da UnB (Universidade de Brasília), Lídia Batista Medeiros, o Brasil ainda não possui normas ou resoluções que especifiquem os padrões de qualidade para a reutilização da água. Porém, de acordo com as normas ambientais vigentes, ela não necessita de tratamento final quando é incorporada aos produtos ou evaporada. Nos demais casos, os efluentes líquidos industriais ou a água residuária, que é o caso da utilizada na lavagem de trens e metrôs, precisam ser tratados, uma vez que são contaminados com resíduos dos processos produtivos.

“Para lavar um trem, a água não precisa ser potável, contudo ainda não existe resolução que defina os padrões de qualidade para água não potável. Uma norma ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) sobre o reúso está sendo escrita”, explica Lídia.

Para o especialista em recursos hídricos da ANA (Agência Nacional de Águas), Cláudio Itaborai, é necessário que seja criada uma política nacional de reúso de esgoto sanitário tratado, importante fonte de água para reúso.

“Temos várias legislações e diversas entidades que atuam sobre o tema, mas devemos harmonizar essas regras para que a prática possa ter uma integração entre todos os atores envolvidos”, finaliza.

Reaproveitamento

Outra alternativa encontrada pelas concessionárias metroferroviárias para reduzir o consumo de água na lavagem de trens e metrôs é o aproveitamento de água da chuva. De acordo com a bióloga Lídia Batista Medeiros, para isso, é necessário instalar um sistema que permita capturar a água dos telhados e dos pisos. “Pode haver um sistema de tratamento descentralizado, com a lavagem dos veículos ou vagões em local impermeabilizado. Uma calha recolheria essa água que seria enviada para uma unidade de tratamento, que poderia ser física, química ou biológica, ou todos juntos. Depois do tratamento, essa água poderia ser utilizada. A economia seria de, no mínimo, 60%”, explica.

É o que vem sendo feito em Porto Alegre (RS) pela Trensurb
(Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S.A.). O sistema instalado pela concessionária preserva os recursos hídricos com a utilização de água não potável na lavagem dos trens, reduzindo, assim, os gastos com o recurso tratado. A concessionária opera uma linha de trens urbanos com extensão de 43,8 km no eixo norte da Região Metropolitana de Porto Alegre, com 22 estações e uma frota de 25 trens, com outros 15 sendo integrados.

Segundo o engenheiro ambiental e responsável pelo setor de responsabilidade socioambiental da Trensurb, Guilherme Campos, a captação da água da chuva começou a ser feita em junho de 2011 e, atualmente, com a quantidade armazenada, é possível realizar a lavagem externa de um trem de quatro vagões diariamente.

A água é captada em um telhado com área de 5.000 metros quadrados e depositada em uma cisterna com capacidade de 250 mil litros. “Objetivo é aproveitar um recurso natural disponível a baixo custo, evitando o uso de água potável (tratada e fluoretada) para fins menos nobres, como a lavagem dos trens. Para os operadores da lavagem, isso não gera mudanças significativas. O que muda é apenas a origem da água. Até as mangueiras utilizadas são as mesmas. Quanto à economia gerada, observamos um reaproveitamento de até 60 mil litros por mês na lavagem. Estimamos que a economia possa chegar a até R$ 20 mil mensais”.

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Outubro/2017 – Revista CNT Transporte Atual