Governadores vão à China para conquistar recursos

Em situação de penúria, os governos estaduais estão fazendo peregrinações à China em busca de investidores para movimentar suas economias, principalmente com o financiamento para obras de infraestrutura. Projetos industriais e na área de mineração também têm sido apresentados aos asiáticos na tentativa de alavancar os investimentos nos Estados.

A ofensiva ocorre de forma independente das relações entre Pequim e o governo federal, que ficaram mais incertas após a chegada do presidente Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto. Para atenuar o estranhamento inicial, depois de suas declarações de que “a China não está comprando no Brasil, está comprando o Brasil”, Bolsonaro prepara uma visita oficial ao país em agosto.

Muitos governadores resolveram não esperar tanto tempo e colocaram a China no topo de suas prioridades. Ratinho Jr. (PSD) esteve em Xangai há duas semanas e iniciou conversas com os chineses para viabilizar a construção de um corredor ferroviário entre o Paraná e o porto chileno de Antofagasta. Rui Costa (PT), da Bahia, começa hoje uma agenda no país que tem a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e o Porto Sul de Ilhéus como grandes pontos de interesse.

Em fevereiro, Costa assinou contrato com um consórcio liderado pela chinesa BYD para o VLT metropolitano, que prevê investimento de R$ 1,5 bilhão. A linha, na verdade um monotrilho com 22 estações e previsão de transportar 150 mil usuários por dia, será construída e operada por meio de uma parceria público-privada (PPP). O governo estadual vai aportar R$ 153 milhões por ano como contraprestação.

“É importante ter investimento externo com juros mais baixos”, diz o governador do Amapá, Waldez Góes (PSD), que relata ter sido sondado pelos chineses, especialmente para projetos de infraestrutura. “Aqui paga-se muito caro pelo financiamento via bancos públicos, como BNDES, Caixa e Banco do Brasil.”

O secretário de Desenvolvimento Econômico de Alagoas, Rafael Brito, afirma que a China surge como “solução fundamental” em um momento de paralisia dos investimentos federais brasileiros. Brito diz que o ano começou movimentado, com muitas conversas avançadas com empresários brasileiros. “Mas, com o passar do tempo, a gente sentiu a coisa dar uma pausa, [os empresários brasileiros] preferiram esperar para ver o que vai acontecer com o país”, observa.

Em julho, Alagoas fará dois eventos em Pequim e Xangai. As conversas Alagoas-China têm priorizado temas como energia solar, plantas industriais, saneamento básico e recursos hídricos.

Um dos principais facilitadores da aproximação com os governadores tem sido o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCIBC), Charles Tang, um chinês que iniciou sua carreira em um banco de investimentos em Wall Street e dedica-se à ponte entre os dois países desde o fim da década de 1970.

“Logicamente não se pode divorciar os Estados do país, mas muitos governos estaduais estão buscando uma agenda própria com a China”, afirma. Um exemplo é o escritório comercial de São Paulo em Xangai, que o governador João Doria (PSDB) deseja inaugurar em agosto e deverá ser chefiado pelo diplomata aposentado Marcos Caramuru, ex-embaixador do Brasil na China.

Tang comenta que geração de energia a partir de biomassa do lixo, iluminação pública, sistemas de vigilância e reconhecimento facial estão no radar dos governadores – e também de vários prefeitos. Tang menciona, no entanto, uma preocupação bastante comum dos investidores chineses: a existência de garantias financeiras para os projetos.

A CCIBC organiza uma visita do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), para Pequim no segundo semestre. O Estado pretende anunciar ainda neste mês a construção de polo metalmecânico, um empreendimento da Vale em parceria com empresários chineses, que envolve investimento em torno de US$ 300 milhões.

Ao Valor, Helder explica que projeto foca na verticalização do minério de ferro extraído de Carajás para uma laminadora a ser instalada no município de Marabá. Paralelamente, o Estado negocia outros projetos de portos, rodovias e ferrovias.

Além de Rui Costa, o secretário de Desenvolvimento Econômico de Mato Grosso, César Miranda, está na China nesta segunda. Ele integra a comitiva do Ministério da Agricultura que desde a semana passada cumpre agenda na Ásia. O secretário deve focar as negociações no setor de proteína animal.

Pernambuco pretende enviar missão à China no mês que vem. Em abril, o Estado anunciou a atração de investimento privado de R$ 3,5 bilhões para construir o maior complexo solar fotovoltaico do país. Apesar de o aporte bilionário ser da espanhola Solatio Energia, todas as placas solares serão importadas da China.

Nas sondagens da China em Goiás, empresários avaliam possibilidades nas áreas de mobilidade, mineração e energia. Em março, representantes da BYD estiveram em Goiânia e discutiram a possibilidade de implantar o VLT na Avenida Anhanguera, principal corredor viário da cidade, além de construir uma fábrica no Estado. Haverá, nos próximos dias, uma reunião entre o governo estadual e três empresas dos setores ferroviário e de infraestrutura interessados em discutir possíveis investimentos.

Em abril, o governo da Paraíba, investidores chineses e americanos assinaram protocolo de intenções para a instalação de um estaleiro para reparos navais, no município de Lucena, no litoral do Estado. Com investimento inicial na ordem de R$ 3,5 bilhões, a chinesa IMC Y Y e a americana McQuilling vão operar o estaleiro por dez anos. Segundo o governo da Paraíba, as obras devem começar em dez meses.

13/05/2019 – Valor Econômico

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