A imagem tradicional do dono de empresa de ônibus que chega à garagem ainda de madrugada, conversa com os funcionários e atua somente transportando pessoas em suas linhas parece cada vez mais estar ficando para trás.

Diversas pequenas empresas estão deixando o mercado, cada vez mais competitivo e exigente.

Crises econômicas, políticas públicas que não privilegiam os transportes coletivos, os impasses sobre os financiamentos das gratuidades e os problemas de sucessão (com herdeiros sem habilidade ou interesse pelo ramo) contribuem para que muitas empresas sumam do mapa.

Conforme divulgou o Diário do Transporte em fevereiro, segundo dados da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, que reúne cerca de 500 viações em todo o Brasil, o endividamento médio do setor hoje corresponde a 33% do faturamento anual, segundo pesquisa realizada com 225 empresas em maio do ano passado. Outra consulta às entidades do setor revelou que 16 empresas entraram em falência e 40 fecharam as portas num período de três anos (2014/2016). No total, 56 deixaram de operar, o que representa cerca de 10% do universo de empresas associadas à NTU.

Assim, mesmo que ainda com várias empresas em todo o País, ao menos nas médias e grandes cidades, os serviços de transportes de passageiros estão cada vez mais em menos mãos.

Isso já vem acontecendo há cerca de uma década e meia, mas agora, o que se tem observado, mesmo que de maneira ainda não generalizada, é o movimento de grandes grupos empresariais de ônibus atuarem em toda a cadeia de transportes.

Não se trata de o empresário de ônibus ter vários negócios distintos, algo que já acontece também, e, sim, de deixar de ser dono e operador de frota para se tornar investidor de transportes públicos, abordando toda a cadeira.

Financiamento de ônibus, revenda de chassis, fabricação de carrocerias, de sistemas de trólebus e ônibus elétricos, bilhetagem eletrônica e, mais recentemente, os operadores de transportes sobre pneus estão entrando nos trilhos.

No Estado de São Paulo, isso já é realidade.

O Grupo Comporte, de família de Constantino Oliveira, assinou, em 2015, o contrato de uma PPP – Parceria Público Privada, por meio da BR Mobilidade Baixada Santista, para operar, manter e participar da ampliação (no caso da terceira fase, ainda em projeto) do VLT – Veículo Leve sobre Trilhos, que opera hoje entre Santos e São Vicente, no Litoral Paulista.

O contrato de PPP, por um período de 20 anos, foi estimado em R$ 5,6 bilhões.

Nesta quinta-feira, 05 de abril de 2018, o Governo do Estado de São Paulo assinou o contrato de concessão da operação da linha 5 Lilás com o grupo Via Mobilidade, consórcio formado pela CCR e Grupo Ruas Invest, este ligado a empresas e encarroçadoras de ônibus em São Paulo. O contrato de concessão é de 20 anos e deve render neste período, entre receitas tarifárias e não tarifárias, R$ 10,8 bilhões. Nesta quinta, o grupo Via Mobilidade depositou a primeira parcela de R$ 554,62 milhões. A exigência de investimentos é em torno de R$ 3 bilhões, entre trens, equipamentos e modernizações de estações, por exemplo. O grupo, na mesma concessão, também vai operar a linha 17 Ouro do monotrilho, que atende às regiões do Morumbi e do Aeroporto de Congonhas, na zona Sul da cidade de São Paulo.

O mesmo Grupo Ruas tem participação na ViaQuatro, operadora da linha 4 Amarela (Butantã-Luz) do Metrô de São Paulo também.

O Grupo Ruas, por meio da RuasInvest, também quer participar da Linha 6 Laranja do Metrô (Brasilândia – São Joaquim), cuja PPP – Parceria Público Privada, com o Consórcio Move SP (formado pelas empresas Odebrecht, Queiroz Galvão e UTC) está em processo de caducidade por não haver cumprimentos de prazos e entendimentos sobre investimentos e remunerações. A holding que tem a frente o maior empresário de ônibus da capital paulista, José Ruas Vaz, se associou a investidores chineses que queriam “comprar” a concessão, mas o negócio acabou não indo para a frente.

O Grupo Ruas hoje atua em diversos negócios ligados ao transporte de passageiros. Financia ônibus, por meio do Banco Luso Brasileiro, cuida dos pontos e abrigos dos ônibus da cidade por meio da Otima, da qual se tornou acionista majoritário, conforme noticiou o Diário do Transporte, em julho de 2017 – Relembre: https://diariodotransporte.com.br/2017/07/04/ruas-se-torna-o-maior-acionista-da-otima-ao-comprar-parte-da-odebrecht/

E desde 2001, quando assumiu a marca Caio (em 2009, as instalações e estruturas foram arrematadas), fabrica as carrocerias de ônibus.

Agora, sócios em comum na Caio também estão no controle de outra fabricante de carrocerias de ônibus: a Busscar, de Joinville, que deve se concentrar na produção de modelos rodoviários. A Caio é especializada em ônibus urbanos.

As concessões dos sistemas de trilhos com participação de grupos empresariais que operam ônibus, tanto no Litoral Paulista como na Capital, são de responsabilidade do Governo do Estado de São Paulo.

Ao ser perguntado pelo Diário do Transporte se é uma tendência grandes empresários de ônibus entrarem nos trilhos, o secretário de transportes metropolitanos, Clodoaldo Pelissioni, acredita que sim. Para Pelissioni, o caminho que se tem desenhado é a presença do operador de transporte, com atuação em mais de um modal. A declaração foi logo após a cerimônia de entrega da estação Moema, da linha 5 Lilás do Metrô, nesta quinta-feira, 05 de abril de 2018.

“Eu acredito que eles têm se colocado como operadores de transportes. Pode ser uma tendência. Com certeza quando a linha aqui de Moema estiver concluída até o final do ano, vai haver um grande rearranjo no transporte municipal, inclusive a SPTrans [São Paulo Transporte – gerenciadora dos ônibus municipais da capital paulista] já está com esse rearranjo na nova licitação [das linhas de ônibus]. Por que? Porque muito provavelmente o metrô vai substituir, o usuário vai migrar do pneu para o metrô. E o importante é que o sistema seja integrado, que essas linhas possam migrar para outros lugares que haja maior necessidade’ – disse o secretário.

A linha 5 Lilás teve dois interessados, o Consórcio Via Mobilidade (CCR e Grupo Ruas – Ruas Invest), declarado vencedor pelo Governo do Estado de São Paulo, e o Consórcio MetrôSP (da CS Brasil, do Grupo JSL -Júlio Simões Logística, com sede em Mogi das Cruzes, e da coreana SeulMetrô)

A CS Brasil também é operadora de ônibus urbanos, com atuação na Grande São Paulo e interior Paulista.

Isto é, independentemente do consórcio que seria vencedor, a linha 5 Lilás do Metrô que, quando completa, deve ser uma das mais carregadas do sistema, teria a participação de um operador de ônibus.

O próximo passo que parecer ser também uma tendência é o operador de ônibus construir os corredores BRT. Em Sorocaba, no interior de São Paulo, o modelo pode virar realidade.

06/04/2018 – Diário do Transporte
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